Volta
e meia leio notícias sobre casais famosos que se separam depois de anos
de relacionamento. Quando são questionados sobre quem tomou a iniciativa
do desenlace, a resposta quase sempre é um primor de civilidade:
comum acordo. Um dia acordaram e descobriram juntos, às nove horas,
24 minutos e 15 segundos, que o amor havia acabado. Cada um puxa sua
mala de cima do armário e ruma para uma nova vida. Um serviço limpo. Sei.
Nem um expert em água-com-açúcar conseguiria criar uma cena tão
inverossímil.
Ninguém deixa de amar o outro no mesmo instante em que deixou
de ser amado. Se isso fosse possível, a palavra rejeição seria banida
do vocabulário. A verdade é que sempre tem alguém que toma a iniciativa
de romper, e mesmo que as coisas estejam péssimas, mesmo que não
haja outra solução a não ser o divórcio, quem fala primeiro levanta mais
rápido.
Comum
acordo, só na hora de se aproximar. O casal se estuda, se procura, se
encontra e o primeiro beijo vem com garantia de reciprocidade. Daí em diante
é festa. Até que ambos, em silêncio, começam a avaliar o relacionamento.
Os lábios ainda se tocam, mas os cérebros mal se cumprimentam.
Cada um analisa o que está acontecendo sob um prisma absolutamente
particular, até que um deles solta o verbo e se despede.
Sobra
aquele que ficou quieto.
Não
existe separação sincronizada, e essa talvez seja a grande dor do adeus.
Quem é dispensado carrega a mágoa de não ter sido consultado, de não
ter tido a delicadeza de um aviso prévio, e pior, de ver-se frente a frente
com um destino que lhe foi imposto. Mesmo não havendo mais amor, o
orgulho fica sempre machucado. Fim
de caso é dor dividida: os dois lados sofrem com a saudade e a frustração.
Mas o dono das rédeas, o que teve a coragem de deter a carruagem
no meio do caminho, esse tem sua dor diluída na força que lhe foi
conferida pela decisão. A combinação é cada um ir para o seu lado, mas
apenas um consegue partir. O outro fica ali, parado, procurando entender
a imensa distância que as palavras podem provocar.
Solução?
Faro fino e rapidez. O cara diz: preciso falar com você, e você responde:
sem problema, pode ficar com as crianças nas quartas e sábados. Ele
diz: tenho o maior carinho por você, mas... e você emenda: eu entendo,
eu também me apaixonei por outra pessoa. Isso é que é diálogo de
primeiro mundo, não aquele duelo de gaguejos, acusações e histerismo. Já
sabe: se hoje à noite ele vier com um papo tipo: olha, eu queria... nem
deixe o safado continuar. Encerre você o assunto: pode ficar com os discos
do Piazolla, mas o microondas é meu. Prevenção nunca é demais. Talvez
ele queira apenas convidá-la para jantar, mas vá saber.
(Martha
Medeiros)
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