Sem companheiro, é verdade,
mas não sem esperança
mas não sem esperança
Encalhada, titia, solteirona, enjeitada,
desquitada. E ainda esquisita, histérica, frígida ou, horror dos horrores,
feia. Houve um tempo em que esses termos abomináveis eram comuns para se
referir à mulher madura sem marido. Hoje, não apenas estão soterrados na lata
de lixo que engoliu tantos preconceitos como são pura e simplesmente
inverídicos. Basta olhar à própria volta para constatar: a brasileira moderna
que bate na casa dos 40 sem um homem para chamar de seu não tem, em geral, nada
do antigo estereótipo da solteirona. Ao contrário, costuma ser vaidosa, bem
informada, independente financeiramente e dona de um aguçado foco profissional.
Essas mulheres não estão sozinhas, reconheça-se, porque querem. Embora
exigentes na hora de escolher o parceiro ideal, elas não desistem de
procurá-lo. Querem, sim, como quase todo ser humano, encontrar alguém para
compartilhar os bons e os maus momentos da vida, ter uma companhia, um amigo,
um amante, uma outra metade.
A notícia ruim é fartamente conhecida: está
difícil encontrar um homem assim. A experiência indica que muitas mulheres
nessa faixa vão passar grandes períodos sem um parceiro fixo, se é que o terão.
A carioca Mônica Lopes é uma dessas mulheres. Morena de sorriso contagiante,
dona de uma produtora de eventos culturais, ela tem 47 anos, é solteira e, de
1999 para cá, não teve nenhum relacionamento fixo. Namoros duradouros, com
jeito de casamento, foram três nos dezessete anos em que morou na Alemanha, mas,
desde que voltou para o Brasil, a coisa não engrenou. "Adoraria amar de
novo", diz Mônica. "Não acredito em quem diz que não quer ninguém do
lado. Mulher nenhuma quer morrer sozinha." Gerente-residente de um hotel
de luxo do Rio de Janeiro, Andréa Natal, de 41 anos, pensa de forma muito
parecida. "Gostaria de me apaixonar, ter uma nova história, envelhecer
junto com alguém", diz ela, que foi casada por cinco anos, é mãe de um
menino, e há sete anos está solteira novamente.
Se os corações estão tão disponíveis, o que
tanto impede mulheres assim de encontrar o amor? Em primeiro lugar, elas são
produto dos tempos modernos e do próprio sucesso. A partir do momento em que
uma mulher consegue prover seu sustento, é muito provável que não aceite um
casamento a qualquer preço, do tipo esta é a única saída para a sobrevivência
econômica e social. Se casada, também diminuem as possibilidades de que se
submeta às frustrações ou humilhações de uma união infeliz. Quando demoram a
encontrar um parceiro adequado ou voltam ao mercado emocional, depois de um
relacionamento mais longo, essas mulheres caem na armadilha da
incompatibilidade etária, pois os homens disponíveis, já escassos, estão
interessados em companheiras mais jovens. Por fim, sem encontrar uma companhia,
muitas delas se acostumam às vantagens da vida-solo: a independência, as
decisões rápidas e não discutidas, a casa inteirinha para si, as manhãs de
domingo com uma toalha enrolada na cabeça... Abrir mão disso, pensam, só por um
homem que realmente valha a pena. E aí o círculo se fecha: esse sujeito não
está à vista.
A maior seletividade é um fato da vida,
inevitável. "O grau de exigência da mulher aumentou muito em razão da
independência financeira que ela conquistou. Estamos mais criteriosas",
concorda Regina Butrus, 47 anos, solteira. Procuradora do Ministério Público do
Trabalho, Regina acredita que não é qualquer parceiro que entende a rotina
profissional de uma mulher bem-sucedida. "O homem é pouco compreensivo com
a mulher que tem uma carreira. É complicado, por exemplo, que ela atenda uma
ligação telefônica em casa, no meio da noite, para tratar de trabalho. Não é
qualquer um que entende." Em compensação, mulheres resolvidas
profissionalmente tendem a valorizar menos o histórico papel de provedor do
homem. "Não preciso de um homem que ache que sua função é me ajudar a ir
em frente", diz a empresária mineira Fátima Lomba, 37 anos, uma filha.
"Quero um homem legal, para andar de mãos dadas, ir ao cinema. E que
também me ofereça um ombro para eu contar minhas tristezas." Dona de uma
badalada butique no Rio de Janeiro, Fátima teve um casamento de dez anos e se
separou há seis. Desde então, não surgiu nenhum namoro sério. "Cheguei a
ficar dois anos sem dar um beijo na boca", confidencia.
Acusadas de estar sozinhas devido a um grau
de exigência impossível de ser atendido, mulheres como Fátima insistem em
desmentir a fama de enjoadas. "Não precisa ser um homem com poder
aquisitivo alto. Nem precisa ser um homem culto, mas tem de ser
inteligente", diz Fátima. "Adoro homem careca, com uma barriguinha.
Pode ser até um gari. Mas não pode ser um perdedor. Ele terá de ser o melhor
dos garis", avisa Mônica Lopes. Onde encontrar esse par, que, se não é o
príncipe encantado, é pelo menos um parceiro aceitável? Ergue-se aí outro
obstáculo: para profissionais ocupadas com o trabalho e, eventualmente, com
filhos, sobram poucas opções. Endereços habituais, como barzinhos e outros
pontos de balada, além de pouco produtivos, podem passar exatamente a imagem
oposta à desejada – a da mulher desesperada, a fim de qualquer coisa. "Não
gosto de nenhum tipo de programa que dê a impressão de que estou à caça",
diz Regina Butrus. "Não vou a uma boate sozinha, nem a bares." Como
dica de lugares para conhecer alguém interessante, a gerente Andréa Natal já
ouviu coisas que seriam piadas, se não fossem sérias. "Me aconselharam a
entrar de sócia para um clube ou que eu passasse a freqüentar alguma
igreja", conta.
E a falta que um homem faz? E o sexo? E o
vazio no coração? "Aprendi a curtir a solidão", diz Andréa.
"Descobri que posso ficar bem lendo um livro, cuidando das plantas,
passeando com o cachorro. Não é uma solidão triste", garante, embora
confesse que adoraria ter um homem do lado na hora de ler o manual do novo
videocassete, por exemplo. "Mandar o carro para o conserto e abrir vidro
de palmito também são tarefas que os homens desempenham como ninguém",
lembra, com humor, Regina Butrus. Desenvolvem-se também alternativas discretas
para algumas das carências. "Há uma legião de mulheres que têm amigos que
ajudam a dar uma aliviada na tensão sexual", conta Mônica Lopes. É um tipo
de parceria sexual e de amizade que, segundo ela, convém aos dois lados. Há,
porém, limitações óbvias. "Orgasmo faz bem ao corpo e à alma, mas não fico
plenamente satisfeita. Há mais sensação do que emoção", analisa Mônica,
que também não gosta de sexo casual, com quase desconhecidos, à moda do
"ficar", como fazem os mais jovens. Fátima Lomba é de outra opinião.
"Sou como adolescente, também 'fico'", diz. Numa dessas, ela se
descuidou. Entre a data em que foi entrevistada para esta reportagem e o dia em
que posou para as fotos, descobriu-se grávida de um parceiro ocasional.
Resolveu assumir a alegria e o desafio de ser mãe por conta própria. Não
desistiu, porém, de encontrar um companheiro. A busca continua.
(Por Marcelo Camacho -
http://veja.abril.com.br/especiais/mulher_2003/p_052.html)
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