Sua gastrite resolveu atacar de novo e não deu tempo de
diminuir no cabeleireiro a juba primata que você carrega acima de seu cérebro,
que, hoje, só precisa de descanso, silêncio e alguma bobeira na televisão. Isso
deveria ser simples para uma mulher entender. Hoje você não tá afim de dirigir
até a casa dela, ouvir sobre como ela odeia tal colega de trabalho e falar
coisas que ao mesmo tempo soem dóceis, inteligentes e decididas. Você quer
dormir sem tomar banho, jantar salgadinho murcho e dormir torto no sofá babado.
Não
significa que você tenha dúvidas a respeito do amor que sente. Não quer dizer
que você esteja com uma modelo internacional ou com sua vizinha gordinha, em
casa, ambos nus, comemorando essa mentira deslavada que você inventou pra poder
pular a cerca. Não é porque você não sente saudades ou desistiu de ser
galanteador agora que já ganhou a moça. Você, meu amigo sofredor, tem todo o
direito de simplesmente não estar a fim de vez em quando e elas definitivamente
não têm o direito de transformar isso em um problema.
Mas
a mulher-vítima não trata um homem como um parceiro de vida. Um humano normal
com vontades, preguiças, indolências e flatulências. Ela trata o homem como um
sádico algoz, pronto para maltratá-la, enganá-la e acabar com sua mísera vida,
que é assim desde a época em que seu papai não a elogiava como ela queria. E
não importa o que você faça, nunca será o suficiente. Não importa que você
equilibre qualidades com defeitos, os defeitos vão sempre sobressair. E então,
já que você é esse bosta de ser que só mal lhe faz… por que ela não te larga?
Porque ela tem o desejo inconsciente de ser maltratada. Ela idealiza o chicote
em suas mãos. Ela precisa sofrer e te escolheu pra essa fantasia. Ela adora
pensar que você não presta.
A
mulher-vítima não entende que você precisa trabalhar. Ela acha que está sendo
renegada, preterida, ignorada, humilhada, abusada, explorada, judiada. Ela não
entende que você tem amigos, família e, se bobear, até de seu sono ela vai
reclamar: como assim você dorme ao invés de me idolatrar 24 horas por dia?
Por
que você fez isso comigo justo no dia tal? Por que você ta me falando isso
justo hoje que eu tô num dia tal? Por que você não fez tal coisa justo quando
eu mais precisava de tal? Por que você fez isso sabendo que eu tenho trauma de
tal coisa? Se todo dia é um péssimo dia para errar e se a sua mulher conjuga
cobranças com essas estruturas de frase, você está sendo vítima da
mulher-vítima.
No
começo, você pode até achar que ela age assim tamanha a segurança: se ele não
for perfeito, eu berro; afinal, não me faltam homens querendo saciar todas as
minhas vontades. Mas não se engane, trata-se do ser mais inseguro do planeta:
ele não me ama e eu não suporto isso; portanto, vou querer provas de seu amor a
cada 2 segundos e, como isso é impossível, eu vou me sentir uma completa
infeliz e, mais uma vez, vou me provar que nasci para sofrer e, porque sou
viciada em ser vítima, essa sensação é a minha cheiradinha ou fumadinha ou
picadinha ou pilulazinha diária. Seu “moreco” precisa de um médico, e não de um
homem.
Repita
comigo: você não tem de salvar uma mulher. Amar não significa virar pai ou
médico ou benzedeiro de uma criatura. Você não tem de dizer a coisa certa na
hora certa no dia certo com o sol refletindo em seus penetrantes olhos de
super-homem. Você não tem de ter lido os livros e visto os filmes e baixado as
músicas que ela planejou para não se sentir vítima, mais uma vez, do homem
imperfeito. Você não precisa fazê-la gozar loucamente todas as vezes (mas quase
todas é bom, isso é verdade). Vamos combinar que ela também não é perfeita (pra
começar, ela é bem doida!) e, então, não tá com essa bola toda pra cobrar tanto
assim. Vocês vão crescer juntos, com calma e paciência e respeito e equilíbrio,
ou ela vai continuar esperando que você venha do céu para resgatá-la do inferno
de seu cerebelo inquisidor (este sim o verdadeiro algoz).
Dê
o amor que pode do jeito que der e, se ainda assim a vida dela continuar um mar
de infortúnios, saiba que seu barquinho não tem nada pra fazer a não ser se
arrancar antes de afundar nesse lodo de lágrimas de sangue. Talvez sem nenhum
amor ela aprenda a dar valor para o amor possível.
(Conteúdo ALFA - Tati
Bernardi)
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